Intervenção levanta preocupações sobre influência política nos esforços antiescravagistas.
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, está realizando uma revisão final incomum de uma investigação que pode colocar na lista negra uma unidade de aves do frigorífico JBS SA por submeter trabalhadores a “condições análogas à escravidão”, de acordo com documentos vistos pela Reuters.
Essa interrupção do processo usual gerou preocupações entre fiscais do trabalho e especialistas jurídicos, que a consideraram uma medida sem precedentes que poderia introduzir influência política no esforço de décadas do Brasil para combater a escravidão moderna.
O Ministério do Trabalho não respondeu a um conjunto detalhado de perguntas, mas disse que o processo está em andamento e os recursos da JBS ainda estão sob análise.
O caso decorre de uma operação federal no ano passado que encontrou dez pessoas trabalhando em condições análogas à escravidão para uma empresa contratada para carregar e descarregar cargas para uma unidade avícola da JBS chamada JBS Aves, no estado do Rio Grande do Sul.
Os inspetores descobriram que os trabalhadores eram submetidos a turnos ilegalmente longos, de até 16 horas, e alojados sem acesso a água potável, de acordo com um relatório obtido pela Reuters. A empresa contratada também havia feito descontos ilegais nos salários dos trabalhadores, dificultando a demissão, segundo o relatório.
Em comunicado, a JBS informou à Reuters na quinta-feira que suspendeu imediatamente a prestadora de serviços, rescindiu o contrato e bloqueou a empresa ao tomar conhecimento das alegações. “A empresa tem tolerância zero com violações de direitos trabalhistas e humanos”, acrescentou o comunicado.
Os fiscais do trabalho decidiram em 6 de agosto que a JBS era responsável pelas condições de trabalho dos dez funcionários, pois não realizou a devida diligência para garantir que a contratada os estava tratando de forma legal.
Normalmente, tal decisão resultaria na inclusão da empresa em uma lista de empregadores responsáveis por submeter trabalhadores a condições análogas à escravidão, conhecida como “lista suja”, que deve ser atualizada em outubro.
Uma vez incluída na lista, uma empresa permanece lá por dois anos. Além dos riscos reputacionais associados à listagem, as empresas também são impedidas de obter certos tipos de empréstimos de bancos brasileiros, o que pode significar sérias consequências financeiras para uma empresa ligada a uma das maiores empresas do Brasil.
AMPLAS REPERCUSSÕES
Após a decisão dos fiscais em agosto, um parecer jurídico da Advocacia-Geral da União (AGU), visto pela Reuters, concluiu que o ministro poderia retirar o processo para sua própria revisão, citando a importância da JBS na economia brasileira.
A JBS é uma das maiores empregadoras do Brasil, com cerca de 158.000 funcionários no país, segundo a empresa. Sua divisão Seara, que administra a JBS Aves, reportou receita líquida de US$ 2,2 bilhões de abril a junho, cerca de um décimo do total da empresa.
A inclusão da JBS Aves na lista de trabalho escravo teria “repercussões de ampla magnitude, com repercussões diretas no patrimônio da empresa, em suas relações comerciais, em sua imagem no mercado e, em última instância, poderia gerar impacto significativo no próprio setor econômico em nível nacional”, escreveu a AGU.
A AGU não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.